Tenho observado a pretensa evolução
do pensamento humano sob a ótica do conforto e da segurança na ilusão de estar
caminhando rumo a uma felicidade cada vez maior. Supostamente esses dois elementos
nos dariam a sensação de termos o controle sobre a vida: estou seguro portanto
nada nem ninguém pode me atingir e tenho conforto, o que evita eu me
desgastar fisicamente, promovendo uma vida longa. Porém, se existem mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã
filosofia (William Shakespeare), o que nos leva a acreditar que esse
controle seria possível?
Como uma criança de três anos entro em uma sequência infinita de porquês e aprofundo até encontrar uma única justificativa, a justificativa da sobrevivência: temos um medo selvagem de que um leão faça de nós o seu jantar! Ou de que um tubarão coma apenas uma parte do nosso corpo nos fazendo dependentes até o fim de nossas vidas. É a luta instintiva pela sobrevivência do corpo, ampliada para a sobrevivência da alma e do ego, já que nosso pensamento ficou tão elaborado.
Como uma criança de três anos entro em uma sequência infinita de porquês e aprofundo até encontrar uma única justificativa, a justificativa da sobrevivência: temos um medo selvagem de que um leão faça de nós o seu jantar! Ou de que um tubarão coma apenas uma parte do nosso corpo nos fazendo dependentes até o fim de nossas vidas. É a luta instintiva pela sobrevivência do corpo, ampliada para a sobrevivência da alma e do ego, já que nosso pensamento ficou tão elaborado.
Para adiar a morte física, anímica e
do ego, tratamos de garantir a segurança e o conforto acarpetando nossas
cavernas, dividindo-as em espaços de funções variadas, fechando-as como cofres
e cavando-as com buracos nas pedras para a luz do sol entrar. Juntamo-nos em sociedade
porque em bandos podemos derrotar mais facilmente o leão, porque assim é mais
fácil viver, mesmo muitas vezes nos sentindo
oprimidos pelos limites castradores da cultura.
Criamos mecanismos psicológicos de
crenças que normalmente nos fazem acreditar que a vida é lógica: “Andar
descalço dá resfriado!”, mesmo que isso não seja verdade, é o que repetimos até
se tornar uma. Esse mecanismo de crenças também nos ajuda a explicar o
inexplicável: Deus. Para nos sentirmos realizados, cumpridores do nosso dever,
desenvolvemos mecanismos de projeção, onde o outro é sempre o obstáculo da vida
que me impediu de realizar o que eu queria. Se não fiz, foi por sua causa! Você
que não me deixou!
Mas chega no fim da vida, no momento
do último balanço, nada tem muito mais importância. Quando o freio não existe
mais, começamos a colocar nossas frustrações e mágoas para fora. As projeções são
despejadas nua e cruamente e pessoas que tanto se gostavam a ponto de
conviverem juntas uma grande parte da vida, passam a brigar como nunca. As
crenças podem se reduzir a pedidos desesperados de socorro a Deus e a uma
sensação de abandono.
Nossos complexos de imperadores
egípcios afloram: queremos que as coisas sejam feitas na hora que solicitamos e
do nosso jeito. Banho? Só quando Eu quiser! E Eu não quero nem hoje nem amanhã!
Queremos que todos venham nos atender,
porque fizemos tanto por eles a vida toda e agora é a vez deles de “devolverem
todo esse sacrifício”. As mães são especialistas nisso, porque normalmente se
esqueceram de si para criar os filhos e, de alguma forma, para servir o marido.
Ainda que a mulher tenha cantado cada vez mais sobre seus ossos e esteja
recuperando sua natureza divinamente selvagem, esse processo é muito lento.
A morte é um momento solitário,
ninguém deve querer viver isso pelo outro. Acolher sim, ajudar física e
espiritualmente sim, mas tomar para si, não. Vejo minha mãe chegando ao fim de
sua vida e fazendo esse balanço de forma tão sofrida. Então penso que podemos
nos preparar mais cedo para isso. A pergunta inevitável é “Como?”. Os caminhos
são muitos e pessoais, mas um caminho que me vem claro como um rio de águas
limpas é que se observarmos melhor todos os momentos da vida onde morremos e
renascemos vamos entender a naturalidade desse processo, seu ritmo e o que
contribui para morrermos e o que nos faz renascer. Nesse mecanismo de auto-conhecimento
vamos aos poucos descobrindo quem somos de fato, o que estamos fazendo conosco
à medida que fazemos nossas escolhas, podendo, assim, escolher melhor e recuperar
o fluxo criador, passando a nos expressar mais verdadeira e alegremente,
construindo uma Cultura de Paz.
“...procurar a jugular,
chegar direto ao miolo e aos ossos de tudo que existe na sua vida, porque é ali
que está o seu prazer, é ali que está a sua alegria, é ali que está o Éden(...),
aquele local onde há tempo e liberdade de ser, de perambular, de se maravilhar,
de escrever, cantar e criar sem medo.” Clarissa Pinkola Estés
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